sexta-feira, 11 de julho de 2014


A imprensa achou que eu deixei o JN para ganhar dinheiro’, diz Fátima Bernardes.

Esta foi a primeira vez que conversei longamente com Fátima Bernardes. Mas parecia que eu a conhecia há muito tempo. E, detalhe, ela pode até ter contado uma mentira bem cabeluda, mas eu acreditei em tudo que ela me falou. Isso chama-se credibilidade. E isso, Fátima tem para dar e vender.
A jornalista número 1 da TV Globo fala abertamente, com exclusividade, sobre os comerciais de TV que começou a fazer após comandar um programa próprio. Ela conta ainda como sua rotina de vida mudou depois que passou a trabalhar de manhã. Com vocês, o talento, a simpatia e a sinceridade (continuo acreditando nela) de Fátima Bernardes.
Foto: Maíra Coelho / Agência O Dia
Foto: Maíra Coelho / Agência O Dia
Como é para você ver uma Copa, no Brasil, longe dos estádios?
Eu fiz a Copa de 94 nos Estados Unidos e a de 98 não fui porque os trigêmeos estavam com sete meses. Fiz 2002,2006 e 2010. Acho que já seria diferente por ser no Brasil. É muito curioso assistir os jogos de casa. Esses dias estava falando com a minha filha sobre isso e ela disse: “Eu nem me lembro de você em casa”. Claro, ela tinha sete meses, não iria lembrar mesmo. O primeiro jogo eu organizei em casa, o segundo fomos para casa de outra pessoa, então está sendo mesmo completamente diferente. Estou sendo só torcedora.
Na África do Sul você já sabia que a próxima seria aqui e que seria diferente, né?
Já. Tudo já estava sendo imaginado comigo longe do jornalismo. Na verdade, quando eu propus o programa não imaginava que ficaria no entretenimento. Como era um programa misto, poderia ser lá.
Está sendo melhor?
Ah, eu não diria melhor, não. É diferente. Eu tenho recordações muito boas da época da cobertura. Fazer a cobertura das Copas foi algoque sempre me deu muito prazer. Imagina uma pessoa que sempre gostou de futebol, mas que nunca teve a oportunidade de ir?
Você desde criança gostou de futebol?
Sempre. Eu ouvia no rádio. Eu lembro que o meu era um azulzinho de pilha, e eu ouvia na sentada na porta do meu apartamento, no Méier. Eu ouvia resenha esportiva, adorava. Minha primeira matéria no jornal ‘O Globo’ foi sobre futebol de salão. Engraçado que eu era péssima com bola e fazia dança. Até no queimado eu era a última a ser escolhida.
Esse crescimento nessa parte e o fato de você ser mulher favoreceu?
Eu acho que você surpreende. Sempre que você surpreende, você se dá bem. Acho que um dos momentos que eu surpreendi o público foi quando fiz uma mensagem de fim de ano sapateando. Na época, recebi uma cartinha que dizia: “Nossa, você tem pernas!”. Isso foi de 91 para 92. Depois houve a Copa em 1994 e nós ganhamos. Acredito no fator sorte daquele momento também.
Muitas mulheres passaram a acompanhar mais o esporte com isso, né?
Elas me dizem que gostam e entendem quando eu falo. Mas, nunca foi meu papel fazer uma análise técnica e sim ter um olhar feminino naquela cobertura. Esse ano a Copa caiu no dia dos namorados e me lembrei de duas pautas que fiz com jogadores sobre o assunto. Isso também surpreendia os jogadores. Eu recebia respostas muito legais, porque eram desarmadas e não iria comprometer. Acho que tudo isso ajudou.
Você sempre entendeu de regra?
Sim. Meu pai não teve filho, só duas meninas. Eu sou a mais velha e ele sempre assistiu muito esporte. Nós fomos poucas vezes ao estádio, mas assistíamos muito. O caso é grave, eu ouvia até basquete no rádio.
Como é sua vida agora trabalhando com entretenimento? É como você imaginava?
Olha, é mais puxado. É muito puxado. Aqui eu tenho horário como era com o jornal, um horário para o programa ir ao ar. Só que, na época do ‘Jornal Nacional’, aquela era a minha última atividade do dia. Aqui, eu chego no Projac às 7h para revisar o programa antes de ele ir ao ar, depois vou para maquiagem e preparo minhas fichas. Sou eu que as faço. Sempre estudei escrevendo, com o roteiro eu escrevo minha colinha para não esquecer do nome da pessoa, profissão, ainda mais que recebemos muitos anônimos e não temos teleprompter. Meio-dia, quando o programa acaba, eu almoço aqui e começo as reuniões de pauta. O programa não é um jornal, mas precisa do factual. É uma roda viva. Eu achava que fazendo o programa de manhã, logo no início da tarde já estaria em casa para tirar um soninho. Nunca consegui esse soninho da tarde.
Me parece um jornalismo menos estressante. Você me corrige, mas um erro no ‘Jornal Nacional’ tem uma consequência muito maior do que no ‘Encontro com Fátima Bernardes’.
Claro, muito. O tempo é menos cruel nesse aspecto. Num telejornal você tem 15 segundos para dar uma notícia e eu aqui disponho disso. Como aqui é tudo no improviso, eu mudo uma brincadeira e corrijo rápido. No caso do ‘Jornal Nacional’, um erro identificado no final, só vai poder ser corrigido no dia seguinte. Nesse aspecto é uma responsabilidade muito maior.
Houve um episódio do ‘Encontro com Fátima Bernardes’ que eu gostei muito e também me questionei por que não foi feito novamente, que foi uma discussão sobre maioridade penal logo depois do assassinato de um menino. Você não pretende fazer mais?
Não. A gente fez vários sobre autismo, que é bem importante, também sobre homossexualismo. O embate depende do convidado. Gosto quando têm pessoas divergentes, porque também, tenho controle sobre essa pessoas. Elas me respeitam e não vai para uma baixaria.
Quando o seu programa foi pensando já era para ser na parte da manhã, mesmo?
Foi eu que pensei.
Por que não à tarde?
Em nenhum momento pensei no horário mais confortável, se seria semanal… Eu ficava em casa na parte da manhã e ficava olhando a programação. Ali eu vi que tinha alguma coisa errada, já que vinhamos de uma programação adulta e de repente, às 10h40, desenho. Pensei que esse espaço poderia ser para mim e foi daí que começou. Ninguém chega para uma emissora como a Globo, com uma grade pensada e estabelecida, e pede do nada um programa. Na época e também na coletiva, o Carlos Henrique Schroder brincou comigo dizendo que achava que aquela minha ideia seria como um amor de verão. E não era, porque eu já estava convicta que queria uma mudança pra mim.
Rotina te enche o saco?
Eu brinco dizendo que a Globo me acostumou mal. Eu mudava de programa praticamente de três em três anos e de repente, fiquei 14 anos no ‘Jornal Nacional’. Não tive tédio, peguei um momento maravilhoso de transformação do jornal, onde levamos pessoas para bancada e entrevistamos os presidenciáveis nas eleições, ancoragem nas ruas… Tudo que eu sonhei em fazer no jornalismo eu fiz. Mas, sempre pensava como estaria dali a cinco e seis anos. Gosto de trabalhar ao vivo, brilhando os olhos, sabe? E, é natural do ser humano a acomodação. Eu não queria que aquilo acontece comigo, porque eu acho que não seria justo com toda história de amor profissional que eu construí. As pessoas podiam achar que está tudo bem, mas por dentro não iria ter o meu brilho interno. Conversamos sobre essa saída há cinco anos. Foi daí que começou a louca com programa de manhã, acordamos antes das seis para vir trabalhar (risos).
É o programa dos seus sonhos?
É o programa dos meus sonhos sim. É tudo que eu sonhei, com as mudanças que ele vem tendo. A TV tem um desgaste muito rápido. Desde o primeiro programa, que eu chamava de carta de intenções, a ideia era de misturar o jornalismo com o entretenimento. O programa tem música, humor, discute a atualidade e tem artista para falar sobre o tema e não das suas carreiras.
Quem é sua inspiração?
Minha mãe. Ela é uma pessoa que sempre me fez enxergar que o trabalho era fundamental para mim. Ela é muito simples, mas muito elegante. Ela queria ser professora, mas se casou cedo, porém, sempre deu valor aos estudos. Ela lê muito, se interessa por tudo e é curiosa. Isso sempre foi minha motivação e inspiração. Agora profissional, gosto da Oprah Winfrey. Acho que o programa não poderia ser exatamente como é aqui. Não acho que renda… Às vezes, ela passa um programa inteiro com uma pessoa. Aqui eu acho que não caberia, as pessoas estão acostumadas a verem muitas coisas ao mesmo tempo.
Uma vez, a Sabrina Sato me disse que hoje em dia não dá para apresentar um programa sozinho. Você, por mais que seja a apresentadora, tem o Marcos Veras, o Lair Rennó…Você concorda com isso?
Ah, sim, eu acho bom. Mas, eu acho que a gente tem muita gente sozinho como Luciano Huck, Faustão e Silvio Santos. É interessante para o público diversificar.
Tem alguma coisa na TV que te surpreende?
Acho que a confiança e disponibilidade das pessoas para falar de tudo e de verdade. Vejo depoimentos que é quase uma sessão de análise. Não sei se nos outros países, ao apontar uma câmeras, as pessoas falam tão bem.
Você fica conectada sempre?
Eu saio do trabalho mas a cabeça não para com a internet e os jornais. Temos um grupo de email da produção que fica online direto. Na hora da minha aula de dança eu deixou um pouquinho de lado, que é duas vezes na semana, na aula com a personal também e claro, no jantar com as crianças.
Como é a sua relação com seus filhos?
É muito tranquila, falamos de tudo. Eles têm liberdade para perguntar as coisas.
Você é muito apegada ao Vinicius? Dizem que mãe com menino é mais junto.
Eu não percebo não. Quando pequeno eu percebia um apego dele comigo, que foi diluindo com o tempo (risos). Eu tive três ao mesmo tempo e sempre tive que dividir. Eles também aprenderam a dividir os pais.
Você tem ciúmes de ele namorar?
Nenhum. É uma tranquilidade. Eu estou muito feliz com a pessoa que ele escolheu. Ele contou que ficou na festinha, o por que ficou e etc. Eu conto como era minha época também. Já tem mais de um ano e é a primeira namorada, uma relação saudável.
Como foi a propaganda entrando na sua vida?
Eles queriam entrar desde o dia que eu disse tchau ao jornalismo.
Você disse muitos ‘nãos’?
Sim, vários. Porque eu estava muito focada no programa.
Achei que você demorou.
Pois é, você e a imprensa inteira achavam que eu vim para ganhar dinheiro (risos). Eu sempre construí meu trabalho passo a passo. Estava vindo para uma área para aprender e não queria que nada atrapalhasse isso. Fiquei quase dois anos só pensando no programa e dizendo ‘não’ para as campanhas. Daí, achei que estava mais à vontade, fazendo piada, dançando e cantando (risos) e o (publicitário) Washington Olivetto veio me mostrar um texto que foi pensando para que eu fizesse. Era uma proposta da Seara que falava sobre mudança e surpreender, bem a ver comigo, além de ser rentável. Afinal, tenho família e quero dar o melhor para os meus filhos.
Não tem merchandising dentro do programa, né?
Tenho, mas o merchandising agrega conteúdo e alguma maneira. Temos a Seara e o Itaú. Como muita gente não sabe lidar com dinheiro, fizemos pauta sobre educação financeira. Ao invés, de eu trazer um especialista, trago um superintendente do Itaú. Não fala de produto, mas fala do serviço. Que é um bom reforço de marca para eles, com nome da empresa grande na tela.
As empresas deram algum retorno pra você?
Sim, muito grande. Assim que começou a campanha da Seara, eles fizeram anúncio de página inteira e em seguida uma pesquisa com o público. O bacana foi que 98% das pessoas que viram o anúncio tiveram vontade de experimentar.
Você tem muita credibilidade.
Mas, isso não veio de graça, não. Isso eu construí.
Tem algum comercial que você não faria? Por exemplo, de cerveja?
Olha, eu não bebo…Eu não sei e não vou dizer que dessa água na beberei. No momento, eu estou procurando coisas que sejam confortáveis. A hora que isso for natural, ok, mas prefiro no momento fazer coisas que tem a ver comigo, assim eu não preciso ser atriz. Eu sei cozinhar, fazer feijão, frango… Acho que na televisão ninguém engana por muito tempo. É um veículo muito transparente.
Você disse que a imprensa achava que você tinha ido para o entretenimento para ganhar dinheiro, não foi?
Não. Foi uma realização profissional minha. Não tinha nenhuma pretensão, eu sempre vivi do meu trabalho.
E a inquieta Fátima Bernardes, o que vai estar fazendo daqui a dez anos?
Não sei (risos). Talvez um programa semanal, né?
Você tem férias igual todo mundo, uma vez por ano?
Sim, igual a todo mundo. Não posso colocar o programa gravado e nem pode fazer retrospectiva.
Você viu o programa nas férias?
Claro que não, né (risos)?! Só me faltava essa. As minhas primeiras férias tive que gravar, e fiquei exausta. Foram três semanas e uma delas era de Natal e Ano Novo. Essa época a gente não descansa, né? Fica naquela função de organizar as coisas e quando você percebe, em pouco tempo está de volta.
Faz uma análise do seu atual momento?
Felicidade, a mesma inquietação e muita realização. Acho que estou no meu melhor momento profissional. Você ter, a essa altura do campeonato, a certeza que a cada dia eu vou ter uma novidade é bom demais. Todo dia vou conhecer muita gente. Sempre gostei de rua, pessoas e de conversar. Isso é muito enriquecedor. O que vou estar fazendo daqui a alguns anos? Não sei, mas vai ser alguma coisa diferente. Meu medo era parar de aprender.
O que você aprendeu de novo?
Várias coisas. Andar foi no ‘Fantástico’, onde as posição são marcadas. Agora ando para todos os lados. Agora, lido com o tempo, que é uma grande dificuldade num programa de 70 minutos. Parece muito, mas não é, passa rápido.
O público tem interesse na sua opinião sobre as coisas não é?
Sim. E eu dou opinião, que foi outra coisa que aprendi. Percebi que é importante eu me posicionar. Não posso me esconder atrás de nada.

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